OAB Subseção Cruz Alta
Sexta-Feira, 19 de abril de 2024

“Carta de Florianópolis” denuncia violação de princípios

06 de outubro de 2005.

Segue a íntegra da Carta de Florianópolis, lida na quinta-feira (29) pelo jurista Fábio Konder Comparato, medalha Ruy Barbosa, durante a cerimônia de encerramento da XIX Conferência Nacional dos Advogados.

"Há três anos, em Salvador, por ocasião da XVIII Conferência Nacional, os advogados brasileiros manifestaram publicamente sua esperança na regeneração política do País, com a eliminação das crônicas desigualdades sociais e dos focos de corrupção que ameaçavam a credibilidade das instituições públicas. Hoje, o sentimento geral é de completa frustração. Reunidos em Florianópolis (SC), na XIX Conferência Nacional dos Advogados, sob o tema "República, Poder e Cidadania", os advogados brasileiros, interpretando os anseios da Nação, tornam pública a sua indignação com o descalabro administrativo, a corrupção, a impunidade e a ausência de políticas públicas que atendam aos objetivos fundamentais da República, declarados na Constituição Federal: construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização, e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de qualquer espécie.

O enfraquecimento dos poderes públicos prejudica o desempenho de sua tarefa maior, que é a defesa da soberania nacional, no que tange, notadamente, aos recursos energéticos, à biodiversidade e à floresta amazônica. Cumprindo seu dever estatutário, os advogados exigem a exemplar punição dos envolvidos em atos de corrupção e malversação de dinheiro público, observado o devido processo legal, impedindo-se que a renúncia ao mandato eletivo faça cessar o processo punitivo. Não podem os advogados aceitar que parte expressiva dos recursos públicos seja destinada a atender à ganância do sistema financeiro, enquanto os direitos fundamentais da pessoa humana, no que se refere ao acesso ao trabalho, à educação, à saúde, à moradia, à terra, à segurança e à Justiça, continuam sistematicamente negados.

No tocante ao funcionamento do aparelho judiciário, é imperativo denunciar as constantes violações aos princípios da ampla defesa e da presunção de inocência, com o desrespeito, mediante ações sensacionalistas, à inviolabilidade profissional do advogado. Violar a advocacia é atentar contra a liberdade, e sem liberdade não há Estado democrático de Direito. A tão esperada Reforma do Judiciário, ainda que tenha apresentado alguns avanços, como a criação do Conselho Nacional de Justiça, cuja autonomia deve ser urgentemente assegurada, ficou muito aquém da expectativa da sociedade. O Judiciário continua distanciado da realidade social. A União, por sua vez, ameaça o equilíbrio federativo, na medida em que não promove a justa repartição da receita tributária entre Estados e Municípios. E o Executivo usurpa a função legislativa do Congresso Nacional, com a excessiva edição de Medidas Provisórias.

Entendem os advogados que o simples aperfeiçoamento do sistema eleitoral é insuficiente para solucionar os graves problemas nacionais. Urge fazer atuar, de modo desembaraçado, os instrumentos de democracia direta consagrados na Constituição – o referendo, o plebiscito e a iniciativa popular –, bem como introduzir novos, tais como a revogação popular de mandatos eletivos e a participação popular na elaboração e execução de orçamentos, em todos os níveis da organização federativa. República, Poder e Cidadania, mais do que um tema, representa, na verdade, a confiança no povo brasileiro, única fonte legítima de todos os Poderes".
 
   
 
 

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